Bartender

Olá! Esse é o primeiro post efetivo após as boas-vindas ao blog. Quanta ansiedade em vos escrever!
O mangá que me propus a resenhar primeiramente é o Bartender, obra escrita por Araki Joh e desenhada por Ken Nagamoto. Comecei a lê-la ano passado, como um incentivo para estudar francês (dizem que você deve associar o estudo de línguas a algo que se gosta, e assim o fiz). Em linhas curtas, Bartender conta sobre os dias de Ryu Sasakura como um barman em diversos bares da região de Ginza (e eventualmente em Chiba), Tóquio, que, pelo que pude entender, é um ponto boêmio da cidade com uma quantidade expressiva de estabelecimentos especializados em coquetéis.

capa

E o mangá gira justamente em torno disso: a vida do barman, a magia dos coquetéis, o encontro com os mais diversos tipos de clientes. Mesmo sendo jovem (o protagonista tem 28 anos na história principal), Sasakura carrega a fama de produzir coquetéis refinados, com toques verdadeiramente fantásticos. E não é por menos, seu objetivo - se é que podemos definir assim - é alcançar a bebida perfeita, a taça de deus - verre de dieu , na tradução que leio. Um título um pouco exagerado? Talvez, contudo o mangá brinca constantemente com esse conceito.

Bartender me chamou a atenção primeiramente por ser uma leitura aparentemente branda, afinal, é um slice of life sobre drinks! Nada de dramas, batalhas épicas, poderes especiais, nem nada.
Nesse quesito, minhas expectativas foram atendidas: o mangá traz um conteúdo forte sobre os variados tipos de coquetéis, contando a origem de cada um e das respetivas bebidas-base. Além, é claro, de demonstrar as astúcias que um bartender deve ter: como preparar os copos, os instrumentos, o ponto e a estrutura do gelo, a delicadeza necessária para manipular gentilmente cada líquido, a maestria com o manusear do shaker. É um banho de informação! Mesmo se bebidas em geral não te interesse, o assunto se torna palatável em razão da maneira que a informação é trazida, sempre com algum contexto e um conto por trás. É notável o esforço que os autores empregaram na pesquisa.

prep

O que nos prende à história - contudo - é como os autores utilizam o cenário de um bar para trabalhar com as mais diversas nuances de sentimentos. A bancada do bar é um palco, conforme os próprios personagens relatam - porém, é um palco onde os clientes podem se despir das façadas e das máscaras sociais que tem de sustentar durante o dia. O bar é o local onde a pessoa pode ser ela mesma, com a ajuda, é claro, de alguma dose de álcool nas veias.

palco

Apesar de parecer uma mensagem de apoio ao consumo de bebidas (talvez seja mesmo), o drink aparece boa parte das vezes como um elemento de ligação, de empatia; o barman é mais do que um empregado do local, está lá para te ouvir, para conversar, nem que seja sobre o tempo, e também para oferecer conforto quando necessário. O drink perfeito serve para afagar os corações machucados, para alegrar os ânimos, para fazer refletir, para trazer memórias de volta. A ênfase, na verdade, vai para o indíviduo do outro lado da bancada, que interpreta os sinais do cliente e processa todas as sensações num drink. Chega a ser poético. Em razão disso, por muitas vezes o barman é levado a um patamar quase sobre-terreno - seria ele uma entidade abençoada por notas etílicas?

mensagem

Outro ponto a destacar em Bartender são as pequenas disputas que aparecem hora ou outra. Como a fama do Sasakura o persegue, por várias vezes ele é desafiado a provar seus dotes como barman. Seja ao preparar drinks para senhores mitólogicos, altamente respeitados na cena de Ginza, seja para provar que o seu paladar é verdadeiramente afinado, ou melhor, quase divino. Em meio a testes cegos, desafios surpresas, gotas de uísque misturados a copos de água, ele quase que sempre leva a melhor - ou ao menos tenta se livrar da melhor maneira possível, com uma pitadinha de lição moral ao final. Eu encaro esses testes como as lutinhas genéricas que vemos nos gibis, mas levadas agora para o balcão do bar.

No fim, Bartender é uma obra que vai se tornando cada vez mais contemplativa - a bebida é apenas uma desculpa para filosofar sobre o valor da vida, o peso da existência, sobre ter arrependimentos ou não, sobre desafios profissionais, sobre amor, morte… enfim sobre a humanidade em si. Não sei se a obra é para todos - às vezes a quantidade de balões pode deixar a leitura pesada. Minha recomendação é ler como se estivesse degustando um drink caro - aos poucos, com parcimônia, apreciando todas as notas e nuances dessa obra tão rica.